quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Tática Defensiva no Ensino do Handebol III,Lucas Leonardo

Tática Defensiva no Ensino do Handebol III
– Jogos de Defesa Individual

3 Setembro 2008 por Lucas Leonardo

Conforme citado no primeiro artigo da série de artigos sobre a importância da aprendizagem dos aspectos defensivos, iremos discutir nesse artigo, de maneira mais detalhada, a importância da adoção de jogos cuja estratégia defensiva seja a realização da defesa individual e como esse tipo de organização defensiva é importante no processo de ensino aprendizagem.

1. Defesa Individual – porque começar por ela?

Uma resposta comum para professores que impõe a seus alunos a defesa individual se dá a partir da reflexão de que esse tipo de estruturação defensiva é a mais simples a ser utilizada pelos alunos.

Na realidade, estudando as fases de compreensão da estruturação do jogo, na realidade, a sistematização defensiva mais fácil de ser utilizada pelos aprendizes nos Jogos Coletivos é a estruturação centrada na bola, ou seja, é aquele famoso “onde a bola está toda a criançada corre”.

A essa estruturação Júlio Garganta (1995) denomina a fase anárquica do jogo, onde a centração na bola é praticamente completa.

Numa segunda e terceira etapas de aprendizado, este mesmo autor destaca para a descentração gradual da bola, mas ainda uma grande centração nas estruturas do jogo, ou seja, passa-se a decentrar a atenção no objeto móvel (a bola), mas a referência dos alunos passa a ser as estruturas fixas (os gols, a quadra de ataque e a quadra de defesa), criando-se aquele famoso jogador que fica na “banheira” e os jogadores que ficam “na defesa” para evitar que o atacante receba a bola sozinho, surgindo então a necessidade de começar a ser individualizada a marcação, sempre com o intuito de não deixar ninguém sozinho na quadra.

Apesar de ser a estratégia defensiva mais adotada pelos iniciantes e também mais promovida pelos professores na iniciação, o estudo das fases de desenvolvimento do jogo por muitas vezes é esquecido ou desconhecido pelo professor e alunos que se encontram ainda em uma fase de desenvolvimento cognitivo bastante centrado no objeto do jogo (a bola) – portanto anárquico – acabam recebendo uma mera informação – “cada um marca um”- do professor que na realidade acaba não sendo bem compreendida pelo aluno criando a este uma grande contradição de objetivos a serem atingidos no jogo – seguir a bola ou seguir o adversário? – e a tal “defesa simples” passa a ser dotada de grande complexidade para o jogador iniciante.

Portanto, defesa individual não pode ser encarada apenas como uma simples determinação do professor e deve ser “pedagogizada”.

Essa reflexão pode ser principalmente defendida quando vemos jogadores em fase de especialização e de alto-nível não conseguindo ter bom desenvolvimento de jogo em situações de defesa individual.

2. Defesa individual é coletiva?

Essa organização defensiva, apesar de ser individualizada e ter uma relação direta de 1 contra 1, não pode ser considerada em essência uma organização descompromissada com a coletividade.

Muitas vezes, ao esquecer-se disso, não fica claro aos alunos a importância que alguns princípios defensivos devem reger as estratégias individuais de cada um dos alunos que marcam de forma individual.

Um princípio que por muitas vezes é esquecido e que possui grande apelo coletivo é a proteção do alvo a ser defendido.

Não é raro vermos alunos que ao serem estimulados a defenderem de maneira individualizada esquecem-se de colocar-se entre o adversário e o alvo, facilitando assim a passagem do adversário em direção ao alvo. Isso por vezes se dá exatamente pelo fato de não ter havido uma “pedagogização” do ensino da defesa individual, e dessa forma, o aluno não mostra autonomia para resolver os problemas complexos de um ambiente de jogo também complexo.

Outro fator de grande apelo coletivo é o fato de que a defesa individual terá um grande êxito principalmente se for capaz de criar uma o conceito de pressão contra a equipe ofensiva, de forma que obrigue a equipe atacante a realizar passes com alto grau de risco.

Isso é possível se as linhas de passe forem constantemente fechadas e se em uma situação de extrema pressão, torna-se possível que uma defesa individual seja transformada em uma defesa grupal sobre o jogador em posse de bola.

Ou seja, cria-se uma situação tão propícia para a recuperação da posse da bola, que mesmo deixando um jogador livre adversário, o jogador em posse de bola não consegue transmitir a bola a este jogador.

Outro fator que tange a defesa individualizada em busca da coletividade é dar aos alunos a consciência de que mais do que marcar um determinado jogador, existe também a possibilidade de “marcar” as linhas de passe as quais o jogador em posse de bola possui, possibilitando a antecipação da trajetória da bola por parte dos marcadores. Isso é bastante comum quando um marcador indireto intercepta a bola – ou seja, aquele que não marcava diretamente o possível receptor da bola abre mão de sua defesa individualizada em detrimento da possibilidade de antecipar a trajetória que a bola está realizando.

Outro ponto especial da marcação individual está no fato de que apesar de ser individual, em algumas situações passa a ser vantajosa a idéia de trocas de marcação, ou seja, visando manter a idéia de que cada 1 é responsável por apenas 1 jogador, pode-se propor jogos em que seja possível haver uma troca de marcação, porém mantendo a proporção de 1 jogador marcando apenas 1 jogador adversário.

3. Jogos Pedagógicos

Com base nesses quatro aspectos – proteção do alvo, criar situação de pressão, marcação das linhas de passe e trocas de marcação – que mostram que no caso da defesa individual deve-se muito mais do que transmitir um conceito, mas sim ENSINAR uma forma de se defender sem que a coletividade seja esquecida, nada melhor do que pensarmos no desenvolvimento de jogos para essa aprendizagem, a final, para aprender a jogar, nada melhor do que jogo (ver mais sobre o jogo como ferramenta pedagógica no artigo Entre o que aprendemos a ensinar e o que aprendemos a jogar jogando do Prof. Riller Reverdito).

Seguem alguns jogos pedagógicos que sistematizem a aprendizagem da defesa individual:

Jogo 1: Pegue o seu rabo com 10 passes

Ênfase: Conceito de Pressão e Marcação da Linha de Passe

Esse jogo é uma variação de um jogo bastante tradicional, no qual cada jogador tem amarrado ao seu short um pequeno pedaço de barbante (parecendo um rabo) e deve protegê-lo impedindo que seja retirado de seus shorts.

Nesse jogo, haverá duas formas de uma equipe marcar pontos: a equipe que possui a posse de bola ganhará 1 ponto sempre que conseguir realizar 10 passes entre si, desde que em nenhum momento a equipe adversária encoste-se à bola. O jogador com posse de bola não pode caminhar com a bola e cada jogador só poderá retirar o rabo do seu respectivo jogador.

Caso a equipe adversária toque na bola ela ganha a posse de bola e passa a tentar realizar os 10 passes – a bola deve ser imediatamente reposta pelo professor, a fim de que o jogo não tenha grandes paradas.

A equipe sem posse de bola, por sua vez, deve tentar, além de recuperar a posse da bola, retirar o barbante (rabo) do jogador que estiver com a posse da bola. Retirado o barbante, a equipe ganha 1 ponto.

O jogador que perder o rabo continua jogando mesmo sem o rabo, o que cria na equipe defensora uma grande necessidade de impedir que o passe chegue a esse jogador, pois ele não tem mais o rabo e, portanto a equipe defensora não conseguirá marcar seu ponto.

É um jogo que estimula estratégias de marcação individual em detrimento da tentativa de criar uma situação de pressão ao detentor da posse de bola de forma que este tenha muitas dificuldades em encontrar um jogador livre para receber a bola.

A tendência do jogo é de que poucos rabos sejam pegos, mas sua presença é imprescindível, pois cada jogador por poder apenas pegar o rabo de seu respectivo jogador atacante, tornará a estratégia de defesa individual a principal do jogo junto com a idéia de impedir que o passe chegue a esse jogador e a possibilidade de marcação da linha de passe.

Jogo 2: Jogos de Alvo Central (vale atacar o alvo por todos os lados)

Ênfase: Proteção do Alvo e Trocas de Marcação

Para enfatizar a proteção do alvo, torna-se interessante utilizar jogos que tenham em sua estrutura apenas 1 alvo, que serve tanto para uma equipe quanto para a outra atacar e defender, ou seja, para um mesmo alvo, se a equipe estiver em posse de bola essa o atacará; se equipe estiver sem a posse da bola, ela o defenderá.

Neste jogo, se o jogador em posse de bola realizar uma trajetória direta ao alvo a equipe atacante marca dois pontos. Caso o jogador tenha que fintar o jogador que o marca, a equipe atacante marcará apenas 1 ponto. Como regra determinante, temos que o alvo para ser atingido deverá ter a bola tocada e não arremessada no alvo.

A centralização do alvo e a subjetividade da regra da presença ou não da finta irá dar ao jogo uma grande necessidade dos jogadores defensores a manter-se entre os jogadores que atacam e o alvo a ser protegido.

A troca da marcação pode ser sugerida ao criar entre os jogadores de uma mesma equipe a possibilidade de que eles realizem uma marcação trocada nos jogadores de responsabilidade de cada um. Ou seja, num jogo de 4×4, a equipe que defende agrupa-se em duas duplas que podem trocar de jogadores que defendem a qualquer momento do jogo.

Vale dar feedbacks sobre as trocas bem feitas e aquelas feitas de forma a não auxiliarem na tática coletiva.

Por exemplo, trocas de marcação na qual os respectivos atacantes estão próximos um dos outros facilita a chance de êxito na troca da marcação, já em situações em que há uma distância muito grande entre os atacantes respectivos à dupla, torna mais difícil essa troca de marcação. Cabe ao professor – claro – analisar e verificar o quanto as trocas estão sendo bem realizadas e conversar isso com os alunos.

Acredito que esses 2 exemplos podem sugerir aos leitores a criação de mais jogos, que podem ser criados de acordo com a criatividade de cada professor.

Até o próximo artigo da série de artigos sobre a Importância da Evolução da Tática Defensiva no Ensino do Handebol.

4. Bibliografia

GARGANTA, Júlio. Para uma Teoria dos Jogos Desportivos Coletivos. In. Graça, A. & Oliveira, J. (Eds.). O ensino dos Jogos Desportivos. Centro de Estudos dos Jogos Desportivos. FCDEF-UP. Porto. Portugal, 1995.